Na linha.

Cambaleava como um bêbado o trem. Olhei janela afora e vi. Vi um céu nublado, branco que doía os olhos. Voltei-me à menina. Aquela ao meu lado. Não te falei? Pois bem: seus cabelos escuros emolduravam a face clara de algodão. O olhar, tão claro e cinza e fundo, encarava o vazio pela janela. Por um instante, juro que me olharam. Uma tatuagem malfeita enfeitava seu antebraço esquerdo. "Uma vez amei, julguei que me amariam". De um dos Fernandos. Mirei seu rosto outra vez. Os olhos eram grandes e separados, e a boca parecia não ter sido feita para sorrir, mas, ainda assim, sorria. Um leve sorriso de canto de boca, mas sorria. Oh, por que raios sentara eu ao lado daquelas coxas roliças? Quisera eu tocar, quisera eu sentir, mas não o fiz. Levantou-se, então, e saiu, como quem nada quer. Como pudera me deixar? Bufei e acomodei-me no lugar que ela antes ocupava. Estava quente de seu corpo. Olhei meu relógio e ao horário suspirei. A viagem ainda era longa e como um bêbado ainda cambaleava o maldito trem.